Esta certamente é uma pergunta das mais importantes. Onde é que estão as coisas? E aqui vai diretamente para o recurso natural água. E junto fica um outro questionamento: este recurso natural é finito ou não? Parece um paradoxo o que vivemos neste momento: um recurso definitivamente essencial para a vida e para o abastecimento de alimentos à população, e que hoje é o insumo que mais se desperdiça através da irrigação para produção de alimentos. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), 70% de toda água disponível no mundo é utilizada para irrigação. No Brasil esse número é de 72%.
A organização social das pessoas tem evoluído de forma crescente nos últimos 12.000 anos e a agricultura obrigatoriamente vem acompanhando este crescimento, buscando atender à necessidade de alimentar com segurança em quantidade e em qualidade. Para atender a este crescimento, o uso da água para irrigação tem crescido a uma taxa duas vezes maior do que o crescimento da sociedade, em especial nestes últimos 150 anos. Dados nos revelam que o gasto de água poderá ser acrescido em até 50% até o ano de 2025 nos países em desenvolvimento e em até 18% nos países desenvolvidos.
Por aí já podemos ter uma ideia de onde é que estão as coisas, ou melhor, como se dá o comportamento social, produtivo, econômico e ambiental do recurso água. Portanto, precisamos sair do foco do uso da água para irrigação e produção de alimentos para abrirmos um debate e adoção de práticas sustentáveis com o foco na “segurança hídrica para garantirmos que o recurso água esteja disponível para atender a produção de alimentos, geração de energia, transporte e preservação de ecossistemas vitais”, como disse o presidente do Conselho Mundial da Água, Ben Braga, em entrevista relativa ao Dia Mundial da Água, comemorado em 22 de março, em referência aos 780 milhões de pessoas que ainda vivem sem acesso a água potável para beber e muitas outras sem saneamento básico.
Portanto, podemos agora, certamente, responder a pergunta “onde é que estão as coisas”? E elas estão onde sempre estiveram: com cada um de nós e com políticas públicas para o desenvolvimento rural, tendo como protagonistas os agricultores familiares e camponeses com o seu conhecimento e saber. Estes agricultores buscam em sua experiência planejar o cultivo olhando toda a paisagem. Este deve ser o norte da chamada agricultura de precisão, que não pode desprezar o saber e o conhecimento rural de gerações. Por exemplo, saber onde se devem manter as florestas e preservar as margens dos rios, tudo isto contribui para estabelecermos uma boa agricultura e o uso equilibrado do recurso água. O trabalho e as ações práticas dos agricultores aliadas ao emprego de tecnologias de produção devem levar em consideração a conservação dos solos, da água e da biodiversidade, independente do que é ou do que será plantado ou criado na unidade de produção. Ou seja, não podemos ter o olhar individualizado para a produção e para o lucro em si, e sim para sustentabilidade social, econômica, produtiva e ambiental para o futuro das gerações. É pouco e pequeno demais pensar somente em si mesmo.
Precisamos investir em tecnologias e em políticas públicas que tenham como foco a redução do consumo de água na agricultura e ao mesmo tempo mantendo a produtividade. Este é o grande desafio para respondermos “onde é que estão as coisas”. Ou seja, precisamos adotar boas práticas de produção no sistema agrícola. Para isso, precisamos investir para além de preservação de nascentes, de implantação de caixas secas. A questão é investirmos em conhecimentos e práticas sustentáveis para as nossas microbacias hidrográficas, que formam o cenário da produção de água em nossas propriedades, e que não tem fronteiras estabelecidas pelo cartório de registro de terras.
Assim, precisamos vencer nossa inércia individualista de produção e do lucro. Precisamos subverter a ordem das políticas públicas de concentração de máquinas, equipamentos para agricultores e suas organizações e adotarmos com vontade, sim, com muita vontade, ferramentas sociais produtivas econômicas e ambientais para o uso eficiente e inteligente de produção na roça. Ou seja, o Estado precisa interferir e ser mais protagonista em suas ações, ouvindo e construindo, junto com o saber dos agricultores, um novo saber para um novo futuro do rural.
Adolfo, ficou muito bacana seu texto.