No Estado temos duas realidades no meio rural. A da agricultura patronal e da agricultura familiar, que apresentam características completamente distintas. A agricultura patronal faz o uso da terra explorando a mão de obra de trabalhadores e trabalhadoras rurais no regime assalariado fixo ou temporário. Separa de forma significativa e brutal a gestão e o trabalho, suga os recursos naturais a sua exaustão. A gestão cabe exclusivamente ao dono da terra, o patrão.
O trabalho cabe àqueles que têm a mão-de-obra e, por isso, são submetidos e explorados ao poder de mando do primeiro. Esta relação de trabalho gera, ao longo do tempo, uma imensa desigualdade social e uma forte concentração de poder e riqueza. Ao longo da história, este modelo de agricultura tem se sustentado pelo êxodo rural, pela relação patrão-empregado, com decisão verticalizada e no sentido de que o capital e o lucro são os elementos centrais do processo.
A agricultura familiar trata do cultivo da terra tendo como seus protagonistas os agricultores familiares, em um regime de gestão exercido pela família rural, com mão de obra exclusivamente familiar, apoiando-se na unidade entre gestão e trabalho. Esta é a característica fundamental que a diferencia da agricultura patronal. Esta agricultura, onde gestão e trabalho estão associados tem, ao longo do tempo, como resultado, um forte progresso social, econômico e ambiental, e se sustenta por uma gestão exercida pela família. É uma agricultura que se fortalece pelo processo de cooperação e solidariedade entre as pessoas e pelas iniciativas em grupo, onde cada um pensa no bem comum para o seu próprio bem, ou seja, e um sistema produtivo em que todos procuram produzir, vender, comprar ou trocar sem querer levar vantagem sobre o outro, com respeito ao meio ambiente, tendo como elemento central o agricultor e sua família, e não o lucro por si só.
Estas duas realidades impõem ao serviço de Assistência Técnica, Extensão Rural e Pesquisa pública estatal uma nova fase, que trata de uma nova consciência crítica sobre sua ação e sobre seus resultados, buscando aprimorar a sua gestão e sua relação com o agricultor familiar e com a sociedade urbana. Nesta visão as intervenções no meio rural passam a ser feitas com base em processos de natureza participativa, levando em consideração os valores culturais e o saber dos agricultores, a participação ativa das famílias e de suas organizações de representação.
Estas observações trazem a reflexão sobre a realidade rural do Estado, onde 71% das propriedades são de agricultura familiar, com área inferior a 50,00 hectares. Esta agricultura torna-se estratégica para ocupação produtiva, geração e distribuição de renda. Desta forma, o serviço de ATER (Assistência Técnica e Extensão Rural) e a Pesquisa pública estatal devem fazer parte das ações estratégicas do governo de Estado, uma vez que a ação extensionista e da assistência técnica propositiva e da pesquisa participativa deve estar presente no dia a dia do agricultor familiar.
Priorizar a Extensão Rural, a Pesquisa e a Assistência Técnica pública e estatal, é o mesmo que dizer para agricultura familiar que o Estado está comprometido com sua inserção social e econômica no mercado, que apoia as iniciativas de produção e processamento, as inovações tecnológicas, que incentiva e prioriza a agroecologia e a produção orgânica como matriz produtiva, comprometendo-se com a produção de alimentos sadios e com a segurança alimentar e nutricional da sociedade.
Há 58 anos a Extensão Rural no Espírito Santo, através de seus servidores públicos, vem contribuindo de forma significativa para o desenvolvimento sustentável da agricultura capixaba, que se expressa pelo compromisso de prestação de serviço público de qualidade e em quantidade aos agricultores familiares, pelo aumento da produtividade e da produção final, pela implantação e fortalecimento de organizações sociais e de representação dos agricultores, pela abertura e consolidação de canais de comercialização como feiras livres e venda direta aos programas de compras governamentais, formação e qualificação dos agricultores e de sua família nas atividades produtivas, implantação de uma matrix tecnológica com base agroecológica e orgânica, processos de inovação tecnológica e pesquisa científica apropriada ao ambiente da unidade de produção, discussão e implantação de tecnologias sociais com valorização do saber e do conhecimento dos agricultores.
Esta realidade, presente no meio rural, vem sendo, a cada ano, mais demandada dos servidores públicos e do Incaper. Novos passos, novas conquistas. Desta forma, pensar em universalização da ATER é, sem duvida, um passo gigantesco para o atendimento aos agricultores e suas famílias. Estes 58 anos impõem a necessidade do fortalecimento do Instituto Capixaba de Pesquisa Assistência Técnica e Extensão Rural – INCAPER. Não queremos ser corporativistas, pois respeitamos as outras formas de ATER, sejam elas por ONG’S ou pela iniciativa privada. Mas não reconhecer a história e a grandeza do trabalho público estatal de ATER e Pesquisa realizado pelo Incaper é não querer ver o importante salto de natureza social, cultural, produtiva, econômica, ambiental e política que este serviço público e estatal trouxe para o meio rural capixaba, não para os governos, mas para o desenvolvimento e crescimento do Estado.
Desreconhecer este serviço, amputar sua ação pública junto aos agricultores e suas famílias e junto as suas organizações sociais produtivas e de representação, é tirar da sociedade rural e urbana o seu direito a um verdadeiro e pleno desenvolvimento sustentável. Retroceder a visões e tomada de atitudes que limitam e estreitam a ação do Incaper e do Estado em seu compromisso público para com todos é tornar o Estado mínimo. E o Estado não pode ser mínimo, precisa ser gigante na prestação de serviços públicos de qualidade e em quantidade na Extensão Rural, na Pesquisa e na Assistência Técnica pública estatal.
O Estado precisa, antes de propor mudanças, pensar junto com a sociedade que tipo de política o cidadão quer para sua felicidade e para sua qualidade de vida!
Autor: Adolfo Bras Sunderhus, presidente da Assin