O deputado federal de Minas Gerais, Zé Silva, apresentou à Câmara Federal o Projeto de Lei (PL) 4.371/2020, que traz, entre outras, as seguintes propostas de alteração na legislação vigente:
– Retira a gratuidade do serviço público de ATER.
– Substitui a centralidade do modelo de agricultura de base ecológica a ser incentivado pelo serviço público de ATER pela agricultura 4.0 (agricultura com emprego de alta tecnologia e com incentivo ao uso de insumos modernos, inclusive da informática).
– Abre os serviços de ATER, que antes era só para os/as agricultores/as familiares, para todos/as os/as agricultores/as do Brasil.
– Exclui os Conselhos Estaduais de Desenvolvimento Rural sustentável do processo de contratação dos serviços de ATER pela ANATER (o processo se dará diretamente com o estado sem passar por conselhos.
– Cria a modalidade parceria para contratação dos serviços de ATER, que não está devidamente esclarecida sobre o que seria;
– Cria a possibilidade das cooperativas participarem da prestação de serviço de ATER, viabilizado pela ANATER.
– Reduz de 30 para 15 dias o período obrigatório de divulgação das chamadas públicas.
– Acaba com as conferências de ATER.
– Retira o CONDRAF da definição das políticas de ATER.
Em uma análise um pouco mais apurada sobre as propostas de mudança, podemos fazer as seguintes considerações:
– As empresas oficiais de ATER do Brasil reivindicam algo em torno de R$ 1 bilhão por ano para atenderem a seus custos, e o orçamento da ANATER é próximo a R$ 50 milhões (5% das necessidades). Aumentar o número de agricultores a assistir é o maior contrassenso. Entendo que o Estado tem que atender a quem mais precisa, e numa situação de escassez de recursos, pela qual o Brasil está passando, não há que se pensar em ampliar o público alvo dos serviços de ATER para atender os médios e grandes produtores.
– Não é compreensível a ampliação do público beneficiário e, ao mesmo tempo, retirar a gratuidade dos serviços. Quem irá pagar pelos serviços de ATER?
– Entendo que tudo o que o Estado fizer para que o/a agricultor/a familiar pratique uma agricultura mais limpa ainda é pouco. Claro que é preciso inserir o/a agricultor/a familiar no mundo da informática, mas não será do dia para a noite. A agricultura 4.0 não é compatível com o/a agricultor/a familiar.
– As grandes cooperativas têm um serviço de Assistência Técnica própria e pretendem captar recursos públicos para prestar esse serviço, sendo que grande parte dos/as beneficiários/as não se enquadram como agricultores/as familiares.
– A exclusão do CONDRAF e dos Conselhos Estaduais de Desenvolvimento Rural Sustentável é uma decisão política de não mais se querer ouvir a sociedade civil. Ela já vem acontecendo desde 2017 e, agora, se escancara através deste projeto de lei 4371/2020.
– A redução do tempo da chamada pública de 30 para 15 dias facilitará o direcionamento da contratação, uma vez que muitas empresas não ficarão sabendo enquanto outras não conseguirão providenciar a documentação neste curto espaço de tempo.
– As conferências de ATER foram processos muito ricos, com a participação dos/as agricultores/as familiares, dos/as extensionistas, dos/as representantes/as do Estado e dos/as movimentos sociais. É uma grande pena acabar com esse processo de conferências. O Brasil perde muito com isso.
– O CONDRAF foi um importante espaço para que fossem proporcionados serviços de qualidade para a agricultura familiar brasileira. Garantiu, também, o fortalecimento das instituições estaduais de ATER.
Após sofrer fortes pressões, o deputado José Silva pediu para arquivar o PL 4371/2020. Mas, ao mesmo tempo, apresentou um novo projeto de lei, que isenta o Imposto de Renda das empresas que destinarem recursos para prestar assistência técnica e extensão rural aos/às agricultores/as de extrema pobreza.
Não entendemos nada do que aconteceu. Pois, em um projeto, o deputado queria ampliar o serviço público de ATER aos médios e, até, grandes produtores; enquanto, num segundo momento, ele apresenta um novo projeto que limita a ATER aos/às agricultores/as de extrema pobreza.
Será que ele está de que lado?
Precisamos ficar atentos/as para analisar os próximos passos!
Texto escrito por Edegar Antônio Formentini, engenheiro agrônomo, extensionista aposentado do Incaper.
Confira, aqui, o posicionamento da ASSIN sobre o PL 4.371/2020.