Texto escrito por Leomar Waiandt, diretor de Política Agrária da FETAES.
Nesta data, dia 17 de abril, foi instituído no Brasil o dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária. A data foi escolhida em homenagem aos trabalhadores e às trabalhadoras rurais, mortos/as em 17 de abril de 1996, no Massacre de Eldorado de Carajás, que ganhou repercussão internacional. Na ocasião, foram assassinados/as 19 trabalhadores e trabalhadoras rurais, centenas ficaram feridos/as e 69 mutilados/as. Na atualidade, a palavra que define este dia para o Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras rurais é: RESISTÊNCIA!
A história sempre nos remete a reflexões, e nos faz entender o contexto de grandes feitos e lutas. Neste caso especifico: a luta pela reforma agrária no nosso país. Antes da chegada da Coroa Portuguesa ao Brasil já havia uma população estimada entre quatro e cinco milhões de pessoas, até então “não descobertas”. Após a chegada dos portugueses, as terras foram divididas em 15 grandes glebas para 12 donatários de confiança da Coroa. É assim que começa a concentração e a má divisão das terras brasileiras. Em 1850 foi criado a Lei da Terra, para reestruturar o sistema fundiário do Brasil. Em seguida, no ano de 1888, foi criada a Lei Áurea, para abolir a escravidão.
Mesmo com a Lei de Terras, a Lei Áurea e outras que decorrem sobre a questão fundiária do país, não foi resolvida a concentração de terras no Brasil. Com o passar do tempo a demanda aumentou, seja pelos escravizados que foram libertados e que almejavam um pedaço de terra para trabalhar, seja pelos povos indígenas ou por outros povos que colonizaram o Brasil. Assim, esses/as trabalhadores/as se unem e começam as reivindicações pela reforma agrária justa. E isso perpassa por algumas organizações até os dias de hoje.
Nesse contexto, a partir de 1945 surgem as Ligas Camponesas pelo Brasil, formada pelos/as assalariados/as rurais e os/as lavradores/as, e sua bandeira principal sempre foi a Reforma Agrária. Um pouco mais a frente, em 1954, foi criada a União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícola do Brasil (ULTAB), responsável por muitas ações e greves importantes realizadas no país. Nesse processo de organização, a partir da existência da ULTAB foram instituídas as Associações de Lavradores e, a partir de então, foram sendo constituídos os Sindicatos de Trabalhadores Rurais com o objetivo de representação e melhorias para a categoria.
No entanto um fato grandioso aconteceu no ano de 1964, quando foi criada a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais (CONTAG), que impunha como uma de suas principais bandeiras a Reforma Agrária, ampla, massiva e justa. Paralelo à criação da CONTAG foi instituído, em1964, o Estatuto da Terra, uma das legislações mais importante para a consolidação e organização da reforma agrária no país. Porém, fatores de repressão também aconteceram ao longo dessa trajetória. Logo após a criação da CONTAG explodiu no Brasil a Ditadura, onde aconteceram varias intervenções militares, principalmente nas organizações constituídas que lutavam em prol do povo sofrido. Nesse período, muitos líderes sindicais tombaram fazendo a luta pela terra.
A Reforma Agrária foi e é uma luta incansável e árdua. A partir da década de 80, os movimentos sociais, entre eles o Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (CONTAG, FETAES e Sindicatos filiados), conseguiram garantir a legalização de vários assentamentos pelo país, veja os números:
No Estado do Espírito Santo, a FETAES ao longo dos seus 53 anos de existência, sempre lutou por políticas estruturantes para o campo, como a luta pela terra. Na atualidade, coordena 30 (trinta) assentamentos de Reforma Agrária e está organizando sete (07) acampamentos que estão em processo de legalização.
Foto: Assentamento Geraldo Sperandio – Córrego da Ferrugem – Pancas ES
Para além da pauta agrária a FETAES reivindica direitos previdenciários e trabalhistas, moradia digna, crédito, assistência técnica, educação, saúde, estradas, transporte, cultura e lazer, entre outros direitos que proporcionam qualidade de vida e de trabalho no meio rural.
A partir das ações de massa, como Grito da Terra Brasil, Marcha das Margaridas, Plenárias da 3ª Idade e Festivais da Juventude Rural, garantimos conquistas importantes para os trabalhadores e as trabalhadoras rurais. Todas as ações têm como referência o Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário (PADRSS), o qual se constitui como uma alternativa ao modelo de produção hegemônico existente no Brasil, que é concentrador de terra, renda e indutor de desigualdades.
Porém, nos últimos anos, as políticas públicas têm sofrido fortes retrocessos em todas as áreas, e não seria diferente na Reforma Agrária. A partir de 2014 inicia-se o retrocesso das pautas sociais, com o retorno da direita ao poder na figura do então Presidente Temer, quando extingue o Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), assim como outros importantes setores que contribuíam e ajudavam na organização da luta pela reforma agrária.
A situação se agrava em 2019, com a eleição do novo presidente do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, que adotou uma política de Estado mínimo, e quando se refere à reforma agrária sempre é de forma contrária, com perseguições e ameaças. Os movimentos de luta pela terra não são ouvidos, com isso inúmeras famílias ficam a mercê de um sistema excludente e, por falta de oportunidades, são obrigadas a ficarem anos e anos aguardando a legalização do processo embaixo de lonas. Assim, a barraca com lona preta se torna um símbolo de luta pela Reforma Agrária.
Por fim, neste dia 17 de abril, a FETAES e seus 60 Sindicatos filiados reafirmam que, na conjuntura atual do nosso país, nada temos a comemorar. Mas na data de hoje fazemos um alerta, principalmente no contexto de pandemia pelo qual passa o nosso país, onde fica ainda mais evidente a necessidade de segurança alimentar para todos/as os/as brasileiros/as: a terra é garantia de alimentação!
A Reforma Agrária é uma política imprescindível para um país extremamente desigual como o Brasil. Então, fica aqui nosso apeloàs autoridades nas esferas constituídas (federal, estaduais e municipais): é preciso retomar a pauta pela Reforma Agrária como ação prioritária de inclusão social. Afinal, a terra precisa ser cuidada para que ela cumpra a sua função social como previsto na Constituição.
Infelizmente ainda somos um dos países com maior concentração fundiária no mundo.
REFORMA AGRÁRIA: NOSSA LUTA VALE A PENA!
Foto: Arquivo Contag
A luta pela posse da terra e uma realidade que vivemos em nosso Brasil e em nosso Estado. Uma luta agraria que envolve mulheres, homens, jovens e crianças que acreditam que através do seu trabalho dia a dia na terra podem construir um novo amanhã e um futuro mais justo e solidário para todos e todas que vivem esta luta e que acreditam ser possível um outro momento na roça, mais justo mais igualitário e solidário. E esta luta se da a partir do conhecimento e das experiencias que estas famílias trazem a partir de sua história e de sua geração e que se ampliam pelo trabalho da Extensão Rural que juntos passam a ser protagonistas de um outra história, uma nova história.