Diretoria Executiva
A desconstrução pública da Extensão Rural pela proposta apresentada pela Ministra Tereza Cristina – ATER Digital destaca os interesses políticos e a visão do atual “governo”, dando sequência ao sucateamento dessa política pública construída com e pelos agricultores (as) familiares, tendo o CONDRAF e a política territorial como sua base, simplificando esta ação com adoção de um modelo que não dialoga com a realidade da agricultura brasileira e, em especial, com a agricultura familiar. A proposta resgata a ótica econômica e do lucro, e perdem-se as relações sociais, os valores e a gestão pública, promovendo ainda mais a exclusão e acumulação de poder e capital.
Nesse sentido, coloca-se em segundo plano a formulação e a tomada de decisão – gestão na unidade de produção familiar o que permite ao capital evidenciar, a sua maneira, o sucesso ou o fracasso da família rural diretamente associado às metas sociais, econômicas e ambientais.
Com esse propósito, historicamente alcançaram-se elevados ganhos de produção final e de lucro, mas trouxe de forma significativa e exponencial um fracasso social cuja dimensão lutamos e lutaremos sempre para superar a fome, a destruição dos recursos naturais, a grave situação de saúde pública deixada pelo uso dos venenos, a grave situação econômica das famílias na roça e a desestruturação familiar com a saída de pessoas em especial dos (as) jovens para cidade, e a perda do pertencimento e da identidade rural.
Estamos vivendo uma complexidade de raciocínios em nossa natureza humana, ao que podemos chamar de conflitos naturais que podem ser de fácil entendimento. De um lado temos os interesses individuais, do outro lado temos um forte sentimento de deveres e obrigações que alimentam nossa relação familiar, comunitária e social, político e ambiental, e a luta por direitos sociais e trabalhistas, que são os interesses coletivos.
Resta-nos saber o que vamos, enquanto sociedade, desenvolver: nossos interesses individuais ou os coletivos? Esta “e a bola que esta em jogo”; que temos que entender, interpretar e criar estratégias para passarmos de uma para outra, mesmo diante de todos os conflitos, uma vez que no dia a dia não temos este comprometimento, por nos mantermos em nossa ação individual que compromete o entendimento e a capacidade de gerar e adotar políticas públicas estruturantes, deixando de exercitarmos o sentido da co-responsabilidade de todos e todas para com o futuro coletivo – comum.
A Extensão Rural em sua lógica e em sua ação pode construir este momento junto às famílias e às comunidades da roça. O que resta saber: em qual canal e em que direção o atual “governo” quer esta ação pública e, em querendo, qual o grau de identidade e de pertencimento que a ela e aos (às) Extensionistas será dado?
A Extensão Rural, em sua ação pedagógica, tem a capacidade de gerar níveis de entendimento e de coesão comprometidos com o objetivo coletivos. Neste sentido, o Estado e os “governos” devem garantir a racionalidade e a transparência desta política pública, não a partir de formas de controle da sociedade, nem como um processo de passividade e conformismo, mas, sim, de transformação, de resignificação e de inclusão para todos e todas que dele participam.
Esta é a riqueza da Extensão Rural, que acontece olho no olho, frente a frente. Discutindo e colocando sobre a mesa não “cartas e interesses para negociar”, mas, sim, conceitos, saberes e conhecimentos que possam interagir, transformar e construir um novo paradigma capaz de permitir uma participação cidadã, em que as pessoas e suas organizações de representação sejam os reais protagonistas de todo o processo, que deve proporcionar o buscar e o encaminhar soluções que apontem o caminho a ser seguido sobre as diversas e conflituosas questões que lhe dizem respeito.
Sem sombra de dúvidas, não podemos pensar que uma ATER Digital seja capaz de proporcionar esta transformação, que não é de produtos e, sim, de pessoas, de comportamentos e atitudes.
A ATER Digital pode até construir um capital econômico para o lucro pelo lucro. Mas a transformação social não irá acontecer, pois apenas o acúmulo de capital e poder estará sendo alimentado.
Precisamos substituir a resignação pela energia capaz de produzir e fortalecer o capital social, o capital moral, que não será encontrado nos barões da produção, nos silos gigantescos de grãos para exportação, nem nas grandes plantações, nem na negação política pela posse da terra. Esta transformação está nas pessoas e somente se manifesta de forma positiva e propositiva quando ocorre a relação entre elas, de forma presencial, que determina a capacidade das pessoas trabalharem juntas.
Somente a prática da Extensão Rural, dia a dia na roça, junto aos (às) agricultores (as) familiares, será capaz de promover esta transformação.