Texto: Adolfo Brás Sunderhus, engenheiro agrônomo, agente de Extensão em Desenvolvimento Rural e coordenador executivo da Faser – Federação Nacional dos Trabalhadores da Assistência Técnica e Extensão Rural e do Setor Público Agrícola do Brasil
Vivemos hoje a antecipação de inquietudes ambientais e sociais projetadas para esta década e aquelas previstas para somente daqui a cinco décadas. Profundas alterações climáticas, perda das camadas de solos férteis, desaparecimento das florestas e dos animais, surgimento de novas doenças, drástica redução da qualidade de vida e uma profunda sensação de que o tempo encolheu e não o encontramos mais.
Estamos tão envolvidos em nossas tarefas diárias, sempre tão urgentes, que não paramos para refletir sobre o suicídio coletivo que representa o atual estilo de vida, no qual está imersa a maior parte das pessoas, das empresas e dos gestores públicos. Na agricultura aumentamos a produção, aumentamos o consumo, aumentamos a degradação ambiental e estamos sempre prontos para justificar politicamente mais degradação, desde que criemos cada vez mais novos empregos, para atender cada vez mais pessoas que nascem e começam a consumir, a produzir resíduos e a fazer mais pressão sobre os recursos naturais.
Somos a espécie dominante na Terra e está dominação tem nos transformado em uma “praga”, devido ao nosso comportamento predatório, imediatista, individualista de querer tudo, sempre mais e agora. O atual modelo de desenvolvimento adotado, enquanto gera enriquecimento para uma pequena parcela da sociedade, gera também forte exclusão social, gera uma forte opulência, e todos degradam.
O modelo também gera uma crise de percepção. Para se manter o atual estilo de vida, destroem-se os sistemas de suporte da vida do ambiente natural. Poluímos as águas que bebemos, o ar que respiramos e os solos que produzem nossos alimentos. Acabamos com as florestas que garantem a água, o clima ameno, o ar puro e o solo produtivo. Por último, dizimamos os animais que compõem a teia da vida e tornamos alguns deles nossos escravos para servirem de fonte de proteínas. Criamos um caos na cadeia alimentar natural e para nossa sustentabilidade social e econômica, comprometendo as gerações futuras.
A nossa ignorância ambiental tem nos levado a produzir pressões insuportáveis sobre os sistemas naturais e a capacidade de suporte dos ecossistemas já foi superada há muito. Estamos vivendo de retiradas contínuas de uma poupança na qual não fazemos nenhum depósito, atuando no “estilo de garimpo”, garimpando e degradando de forma contínua e acelerada nossa própria condição de sustentabilidade e das gerações futuras, a uma velocidade de exploração muitas vezes superior à capacidade de regeneração da natureza.
Estamos explorando todos os limites que a nossa ignorância nos permite. Ou será que aquele em que o nosso “conhecimento” nos permite? Um forte retrato desta realidade é a perda da qualidade de vida, de uma forma generalizada de prejuízo, que se traduz de forma diferenciada entre as diversas comunidades e povos, grupos sociais e pessoas. Vai desde a perda de uma cachoeira de água potável a um riacho que sumiu; de um recanto destruído à violência dos assaltos e do desemprego; do empobrecimento estético à erosão cultural; da insensatez de conflitos sociais, econômicos e políticos à arrogância e à ganância daqueles que as geram.
O desvio desta rota de colisão com a insustentabilidade e a reversão dessa tendência, constitui-se no maior desafio evolucionário a ser enfrentado pela espécie humana desde os tempos em que se organizava em bando, coletivos sociais, comunidades, povos e por fim, nação. E este desafio envolve todas as pessoas em todos os ramos e atividades e de todas as classes sociais, do mundo urbano e do mundo rural. Trata-se não mais de um experimento onde medimos as possíveis consequências. É uma realidade e estamos todos juntos nela: nossa família, nossa capacidade empreendedora, nosso futuro.
O enfrentamento deste desafio requer novas ferramentas teóricas, novas práticas e, sobretudo, o resgate dos saberes, dos valores e da criação coletiva de novos saberes e valores, sintonizados com uma ética e comprometimento social produtivo econômico ambiental político, acima de tudo, humanizadora, capaz de promover o desenvolvimento de habilidades e competências comprometidas com mudanças em prol da sustentabilidade hoje e do futuro.