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Carrinho

A Extensão Rural e a ATER

Por 23 de junho de 2022Associados Assin, Assuntos Gerais

Texto escrito por Adolfo Brás Sunderhus

(Engenheiro agrônomo, extensionista aposentado do Incaper, e operário da terra).

A extensão rural enquanto política pública insere-se fortemente no contexto social da vida das pessoas da roça e vai muito além de ser o ato de “transferir” conhecimento, o que confunde muitos gestores públicos.

Ela se fortalece como uma premissa em um espaço que socializa, discute e gera saber a partir da realidade do/a agricultor/a familiar, na dinâmica própria do tempo e do espaço da roça, juntando, ligando e compreendendo saberes e aspirações, dando oportunidade aos sentimentos e à vontade das famílias da roça de evoluir, crescer e se desenvolver com sustentabilidade.

A Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER), de que tanto falam os gestores públicos, está muito além do simples entendimento de ser uma ferramenta para obter aumento de produtividade – produção e lucro (sem desmerecer sua importância econômica). Insurjo em dizer que se trata de uma conceituação sociológica e ambiental das ciências agrárias, como um capital que tem sua essência nas relações de trabalho coletivo (agricultura familiar), ensejando o desejo do objetivo comum que se fortalece na gestão compartilhada por todos e todas do empreendimento familiar, por grupos e organizações associativas que se estabelecem no ambiente local e territorial.

O momento em que vivemos exige do Estado o compromisso com um serviço de qualidade e quantidade, e que, sobretudo, dialogue com as pessoas com o objetivo de um desenvolvimento sustentável local e territorial. Neste sentido, pensar em um concurso público – ora em curso no Estado do Espírito Santo – se faz necessário e se reveste de uma ação pública importante.

Como ação pública o mesmo deve pautar sua essencialidade partindo de um pensar político comprometido, não com atividades produtivas e sim com a necessidade de que os/as futuros/as profissionais de ATER estejam comprometidos/as com o pensar na essencialidade de uma Extensão Rural contemporânea, muito além de uma assistência técnica e cujo compromisso central é com um diálogo com a família rural a partir de seus saberes e conhecimentos, de suas necessidades e de sua relação com os ecossistemas, com a agroecologia e com os fundamentos humanistas, tendo a agricultura familiar e a produção de alimentos sem uso de venenos como centralidade desta ação. Portanto, esta ação não pode ser somente um “momento político”, ela necessita expressar o real compromisso do governo do Estado e da direção do Incaper com a sustentabilidade do serviço público de Extensão Rural e de Pesquisa Pública para o Estado do Espírito Santo. 

Neste entendimento cabe ao Estado enquanto gestor público estimular a ATER de forma efetiva, por meio do fortalecimento institucional (pessoal, financeiro e com condições de trabalho) dos órgãos públicos que detêm em sua essência esta ação pública; e de forma permanente, em quantidade e qualidade capaz de contribuir na análise e na formulação coletiva de propostas (projetos e ações do poder público), que possam atender as necessidades levantadas por aquela sociedade, bem como fazer a crítica construtiva e oportuna das políticas públicas vigentes com o seu necessário redirecionamento.

Desta forma, dentro de seus conceitos e visão de assistência técnica e extensão rural, a ATER deve desenvolver sua ação enquanto política pública de Estado, no objetivo de motivar e facilitar o desenvolvimento social, comunitário, econômico, político e ambiental, cuja ação se tornará muito mais fácil de ser atingida a partir do grau e da capacidade de entendimento e compreensão do gestor público de ATER e de sua ação proativa para que agricultores/as e suas famílias possam ser protagonistas desta ação, promovendo e oportunizando a todos e todas a capacidade de pensar, propor, compartilhar e de se comprometer com objetivos comuns, devendo esta ação ser um compromisso do Estado, mostrando-se presente, e não somente da sociedade ou da iniciativa dos/as profissionais de ATER local e territorial.

E a pergunta que se faz: onde está o Estado?

Para além dessas observações e desses conceitos, a política pública de ATER e, de forma especial, a Extensão Rural devem ter uma ação pública transformadora, capaz de promover microrrevoluções para a roça e, de forma singular, para aqueles e aquelas que estão excluídos/as desta política pública. Esta deve ser a responsabilidade do Estado e do gestor público de ATER e da Extensão Rural, com essas ações sendo compartilhadas, integradas e coletivas, e tendo como pressuposto a formação de redes de gestão e de controle social. Indicativos primordiais capazes de orientar e estimular o compartilhamento da tomada de decisão, envolvendo os/as protagonistas (Estado – Servidores/as Públicos – Agricultores/as).

Neste entendimento é necessário reiniciarmos uma forte reflexão da presença do Estado e do seu compromisso com a ATER e com a Extensão Rural para a agricultura familiar no Espírito Santo, avaliando quais ações realmente transformadoras têm sido propostas e efetivadas desde 2003, quando de lá para cá somente dois “senhores” têm se revezado na gestão dessa política pública. Reflexão esta que deve balizar o momento político da ATER e da Extensão Rural que já estamos vivendo no Estado e de sua responsabilidade, compromisso e participação política para transformação, revolução e desenvolvimento sustentável para a agricultura familiar.

Basta de egos e da unanimidade que se perpetua no revezamento de apenas duas gestões políticas que desprezam a ATER e a Extensão Rural, numa intensa troca de lados e de peças sem qualquer preocupação com esta política pública e com a agricultura familiar. Pois é só isto que temos. E esta é uma das maiores violências que a agricultura familiar capixaba enfrenta todos os dias. 

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